terça-feira, 24 de novembro de 2009

Os dilemas da comunicação no Brasil


Os proprietários dos grandes meios de comunicação no Brasil defendem, entre seus ideais, a liberdade de expressão, a pluralidade, a competição e o livre mercado। No entanto, o poder midiático no Brasil está concentrado nas mãos de um pequeno grupo de famílias e suas respectivas empresas, que dominam o sistema de produção e difusão de informações e detém a imensa maioria dos recursos de publicidade.

Se fossem coerentes deveriam defender uma revolução capitalista na comunicação brasileira, com mais proprietários, mais veículos, mais produtores de comunicação, produtos de melhor qualidade, consumidores mais exigentes e descentralização dos centros produtores. O artigo é de Joaquim Ernesto Palhares.


Discurso feito pelo diretor da Carta Maior, Joaquim Ernesto Palhares, na mesa que debateu "Princípios da Comunicação", no segundo dia da Conferência Estadual de Comunicação de São Paulo:


“O setor da comunicação no Brasil não reflete os avanços que ao longo dos últimos trinta anos a sociedade brasileira garantiu em outras áreas. Isso impede que o país cresça democraticamente e se torne socialmente mais justo. A democracia brasileira precisa de maior diversidade informativa e de amplo direito à comunicação. Para que isso se torne realidade, é necessário modificar a lógica que impera no setor e que privilegia os interesses dos grandes grupos econômicos”.

Este é um trecho do Manifesto da Mídia Livre, movimento lançado no ano passado, reunindo jornalistas, estudantes, trabalhadores da mídia, professores e representantes de movimentos sociais. O diagnóstico apresentado neste manifesto coloca-se como um desafio para a Conferência Nacional de Comunicação.

Os proprietários dos grandes meios de comunicação no Brasil defendem, entre seus ideais, a liberdade de expressão, a pluralidade, a competição e o livre mercado. No entanto, o poder midiático no Brasil está concentrado nas mãos de um pequeno grupo de famílias e suas respectivas empresas, que dominam o sistema de produção e difusão de informações e detém a imensa maioria dos recursos de publicidade (públicos e privados).

O maior grupo de comunicação do país, a Rede Globo, possui mais de 220 veículos, entre próprios e afiliados. É o único dos grandes conglomerados que possui todos os tipos de mídia, a maioria dos principais grupos regionais e a única presente em todos os Estados brasileiros. Sozinha, a Globo controla mais da metade do mercado televisivo brasileiro. Segundo dados da Associação Nacional de Jornais, relativos ao período 2001-2003, apenas seis grupos empresariais concentram a propriedade de mais da metade da circulação diária de notícias impressas no país. Sozinhos, estes veículos respondem por cerca de 55,46% de toda produção diária dos jornais impressos.

Além do imenso poderio da Globo, outros seis grandes grupos regionais se destacam. A família Sirotsky comanda a Rede Brasil Sul de Comunicações, controlando o mercado midiático no Rio Grande do Sul e em Santa Catarina. A família Jereissati está presente no Ceará e em Alagoas. A família Daou tem grande influência no Acre, Amapá, Rondônia e Roraima. A mídia da Bahia pertence à família Magalhães. No Mato Grosso e no Mato Grosso do Sul, os negócios são controlados pela família Zahran. E, por fim, a família Câmara tem grande influência em Goiás, Distrito Federal e Tocantins. Em suas manifestações editoriais, todas essas empresas afirmam a independência como um valor que, supostamente, definiria seu trabalho. Independentes do quê e de quem, exatamente? Essa pergunta nunca é respondida. E não o é, porque a resposta mostraria que o rei está nu!

Qualquer menção à necessidade de democratizar esse cenário é rebatida fortemente por artigos e editoriais enfurecidos destes grupos hegemônicos. Quem defende a democratização da produção e do acesso à informação é imediatamente acusado de “autoritário” e “inimigo da liberdade de imprensa”. O poder das grandes corporações midiáticas é muito forte, estendendo-se também às escolas e universidades que formam os futuros profissionais da comunicação. A imensa maioria de quem se prepara para entrar no “mercado da comunicação” quer arrumar um emprego na Globo, na Folha de São Paulo, na Veja, no Estadão, na RBS, etc. Profissionais ligados direta ou indiretamente a essas empresas garimpam sistematicamente talentos nos bancos escolares. Os professores que procuram navegar contra a corrente são, o mais das vezes, taxados como excêntricos e confinados a guetos.

É importante ter em mente que esse não é um fenômeno exclusivamente brasileiro. A realidade midiática mundial não é distinta. O escritor francês Paul Virilio, ao falar sobre o papel da mídia no mundo de hoje, definiu bem o tamanho do problema a ser enfrentado. A mídia contemporânea, disse Virilio, é o único poder que tem a prerrogativa de editar suas próprias leis, ao mesmo tempo em que sustenta a pretensão de não se submeter a nenhuma outra. A justificativa para tal procedimento trafega entre o cinismo e a treva: uma vez afetada a liberdade de imprensa, todas as liberdades estarão em perigo. Cinismo, denuncia, porque esta reivindicação agressiva trata de negar o óbvio: os meios de divulgação e de formação de opinião vêm se concentrando, de forma brutal, no mundo inteiro, nas mãos de grandes empresas.

A transformação dos veículos de comunicação em grandes empresas, com interesses que vão muito além daqueles propriamente midiáticos, fez da informação, definitivamente, uma mercadoria regida pela lógica que comanda o mundo do lucro. Ela, a informação, progressivamente, deixa de ser um bem e um serviço público. Isso se reflete diretamente na qualidade dos noticiários que assistimos todos os dias nos jornais, rádios, televisões e sites. A economia passou a reinar nestes espaços. Todo o resto passou a ser tratado de forma secundária e como um espetáculo. Esse fenômeno é mais dramático na política, onde a cobertura tornou-se, no mais das vezes, uma exploração de fofocas, intrigas e banalidades. As pautas e os espaços prioritários passam a ser definidos pelos interesses econômicos estratégicos dessas empresas.

Esse poderio econômico tem repercussão direta na vida política e social do país. Assim, falar da necessidade de democratizar a mídia implica, diretamente, falar da necessidade de democratizar o poder político e econômico. Os interesses econômicos e as articulações políticas decorrentes destes interesses refletem-se diretamente na qualidade da informação oferecida ao público. No Brasil, a cobertura política dos grandes veículos nos últimos anos mal consegue disfarçar seus interesses econômicos e políticos.

Infelizmente estamos caminhando nesta direção, no Brasil e no mundo. A queda na qualidade do jornalismo é algo assustador que ameaça o futuro da própria democracia. Não se trata, portanto, de um debate restrito aos profissionais do setor, mas de uma agenda de toda a sociedade. É o direito de dispor de uma informação de qualidade que está em jogo. E por isso, é preciso começar já. E um dos primeiros passos é o fortalecimento da articulação política entre todos aqueles setores preocupados com a democratização da mídia no Brasil. Mais do que declarações genéricas de apoio, precisamos construir iniciativas concretas que mostrem à população a natureza do problema e como ele influencia na sua vida diária. Essa é uma das agendas que deve avançar na Conferência Nacional de Comunicação.

Esse debate interessa aos próprios empresários do setor que apresenta alguns números preocupantes. Em artigo publicado no Observatório da Imprensa, Carlos Castilho revela alguns dados da surpreendente queda na venda avulsa dos grandes jornais brasileiros. O artigo relata:

A Folha de S.Paulo, considerada um dos três mais influentes jornais do país, vendeu em média 21.849 exemplares diários em bancas em todo o território nacional entre janeiro e setembro de 2009. Em outubro de 1996, a venda avulsa de uma edição dominical da Folha chegava a 489 mil exemplares. Segundo o Instituto Verificador de Circulação (IVC) a Folha é o vigésimo quarto jornal em venda avulsa na lista dos 97 jornais auditados pelo instituto, atrás do Estado de S.Paulo, em 19° lugar e O Globo, em 15° lugar. Somados os três mais influentes jornais brasileiros têm uma venda avulsa de quase 96 mil exemplares diários, o que corresponde a magros 4,45% dos 2.153.891 jornais vendidos diariamente em banca nos primeiros nove meses de 2009.

O atual perfil da imprensa brasileira mostra que os três grandes jornais nacionais agarram-se à classe média para manter assinantes e influenciar na agenda política do país, mesmo com tiragens reduzidíssimas, correspondentes a menos de 5% da média da venda avulsa nacional.

Esses números indicam claramente que algo vai mal na imprensa brasileira. Indicam, sobretudo, a necessidade de profundas mudanças.

Para utilizar uma expressão ao gosto dos grandes empresários do setor, precisamos de uma revolução capitalista na comunicação brasileira. Mais proprietários, mais veículos, mais produtores de comunicação, produtos de melhor qualidade, consumidores mais exigentes, descentralização dos centros produtores para garantir o direito de todos os brasileiros terem informação e comunicação de qualidade. Isso, porém, não será feito no modelo atual, fortemente monopolista e excludente. Os empresários da comunicação precisam decidir se querem mesmo fazer comunicação, entendida como um bem de utilidade pública, ou seguirão tratando-a como uma mercadoria qualquer, cujo sucesso, depende de esmagar os competidores a qualquer preço.

Mas há boas notícias neste cenário. Nos últimos anos, essa hegemonia de grandes grupos midiáticos começou a ser enfrentada por um crescente número de iniciativas. A internet tornou-se um espaço privilegiado dessas iniciativas, mas não o único. Os movimentos de Software Livre, de rádios comunitárias, de construção de redes de comunicação de movimentos sociais, de sites , blogs e publicações alternativas abriram brechas no bloco monopolista da grande mídia. Além disso, jornalistas que conheceram de perto o funcionamento desses grupos passaram a desenvolver um trabalho de exposição das entranhas da imprensa brasileira. O conjunto dessas iniciativas contribuiu para a acumulação de um inédito capital crítico sobre o poder dessas empresas. Um poder, importante assinalar, que segue muito forte.

Falar de uma comunicação de qualidade, neste cenário, significa falar, entre outras coisas, em liberdade de criação, de difusão e de acesso. Significa compartilhar conhecimentos, recursos, práticas e iniciativas. As palavras “liberdades” e “compartilhamento” expressam, em boa medida, o que é sonegado hoje à maioria da população. Elas apontam para uma visão generosa de um mundo mais solidário, onde a comunicação, o diálogo com o próximo e a criatividade não são reduzidas à condição de mais uma mercadoria destinada a gerar lucro máximo a custo mínimo.

Esse é o espírito que deve animar nossos debates na Conferência em busca da construção de um espaço que propicie o encontro, o diálogo, a criação e a partilha de informações, práticas e experiências. Um espaço que, fundamentalmente, enxergue a comunicação como uma prática a serviço da verdade, da justiça e da liberdade e não como meramente mais uma fonte de lucro.

sábado, 21 de novembro de 2009

Venda avulsa de jornalões brasileiros cai a índices surpreendentes

Quando você descobre que a Folha de S.Paulo, considerada um dos três mais influentes jornais do país, vendeu em média 21.849 exemplares diários em bancas em todo o território nacional entre janeiro e setembro de 2009, é possível constatar a abissal queda de circulação na chamada grande imprensa brasileira. Em outubro de 1996, a venda avulsa de uma edição dominical da Folha chegava a 489 mil exemplares. Os três grandes jornais nacionais agarram-se à classe média para manter assinantes e influenciar na agenda política do país, mesmo com tiragens reduzidíssimas. O artigo é de Carlos Castilho, do Observatório da Imprensa.

Artigo publicado originalmente no Observatório da Imprensa

Fala-se muito na crise das publicações impressas, como jornais e revistas, mas quando se analisa os dados reais percebe-se que a situação é muito mais grave do que imaginamos e que a busca por novos modelos de negócios é ainda mais urgente do que se previa.

Quando você descobre que a Folha de S.Paulo, considerada um dos três mais influentes jornais do país, vendeu em média 21.849 exemplares diários em bancas em todo o território nacional entre janeiro e setembro de 2009, é possível constatar a abissal queda de circulação na chamada grande imprensa brasileira. Em outubro de 1996, a venda avulsa de uma edição dominical da Folha chegava a 489 mil exemplares.

Segundo o Instituto Verificador de Circulação (IVC) a Folha é o vigésimo quarto jornal em venda avulsa na lista dos 97 jornais auditados pelo instituto, atrás do Estado de S.Paulo, em 19° lugar e O Globo, em 15° lugar. Somados os três mais influentes jornais brasileiros têm uma venda avulsa de quase 96 mil exemplares diários, o que corresponde a magros 4,45% dos 2.153.891 jornais vendidos diariamente em banca nos primeiros nove meses de 2009.

São números muito pequenos comparados ao prestígio dos três jornalões, responsáveis por boa parte da agenda pública nacional. Globo, Folha e Estado compensam sua baixa venda avulsa com um considerável número de assinantes, o que configura a seguinte situação: os três jornais dependem mais do que nunca das classes A e B, que são maioria absoluta entre os assinantes, já que a população de menor renda é a principal cliente nas compras avulsas em bancas.

Esta constatação não é nova, mas ela aponta um dilema crucial: as classes A e B são aquelas onde a penetração informativa da internet é mais intensa. Nesta conjuntura, o futuro de O Globo, Estado e Folha depende umbilicalmente das classes média e alta, o que levou a uma disputa acirrada para saber qual deles interpreta melhor a ideologia destes segmentos sociais.

O atual perfil da imprensa brasileira mostra que os três grandes jornais nacionais agarram-se à classe média para manter assinantes e influenciar na agenda política do país, mesmo com tiragens reduzidíssimas, correspondentes a menos de 5% da média da venda avulsa nacional.

Nos últimos nove meses houve uma pequena recuperação nos índices de venda avulsa do Globo, Estado e Folha em 2009. O IVC registrou um crescimento de 5,5 % em relação aos quatro últimos meses do ano passado. É um aumento bem acima da média dos 97 jornais auditados pelo IVC, cuja venda avulsa diária total subiu insignificantes 0,27% no mesmo período. Mas a recuperação tem que ser vista num contexto de patamares muito baixos e que não garantem a rentabilidade futura dos jornais.

Em compensação os jornais locais e populares ocupam um espaço cada vez maior na mídia nacional. Dos dez jornais com maior venda avulsa, segundo dados do IVC, nove são claramente populares, voltados para as classes C e D. Destes, dois são de Minas Gerais, um do Rio Grande do Sul, cinco do Rio e dois de São Paulo. Somados eles chegam a uma venda avulsa diária média de 1.401.054 exemplares, ou seja 64,5% de todos os jornais auditados entre janeiro e setembro do ano passado.

O jornal Super Notícia, de Belo Horizonte, vende em bancas, em média, 290.047 exemplares (13,47% de todos os jornais auditados pelo IVC) - o que corresponde a cerca de 13,2 vezes a circulação avulsa da Folha de S.Paulo, em todo o país. Números que indicam uma clara tendência do mercado da venda avulsa de jornais no sentido das publicações populares, regionais, com apelo sensacionalista.

Isto também significa que os grandes jornais, tradicionais vitrines da agenda nacional, dependem, hoje, mais do prestígio herdado do passado do que do fluxo de caixa. A sua principal matéria prima, a notícia, perdeu valor de mercado em favor da opinião. Um prestígio que ainda alimenta uma receita publicitária compensadora, principalmente no setor imobiliário, de supermercados e revendas de automóveis, mas cujos dias também estão contados porque a migração destes segmentos para a internet é cada vez maior.

O conglomerado Globo aposta cada vez mais nos jornais populares regionais e segmentados - como o Extra, no Rio. Talvez busque inspiração no caso do Lance!, um jornal esportivo que vende, na média diária, 124 mil exemplares em bancas e jornaleiros. No sul, o grupo RBS aposta no Diário Gaúcho, o terceiro em vendas avulsas no ranking nacional do IVC e 8,4 vezes maior do que a do carro chefe do conglomerado, o jornal Zero Hora.

quarta-feira, 18 de novembro de 2009

A velha mídia e sua batalha inglória

Carta Maior:

A Folha de São Paulo publicou editorial neste domingo criticando "práticas desleais na internet" que estariam "colocando em risco as bases que permitem o exercício do jornalismo no país". A Folha, no caso, se apresenta como porta-voz deste jornalismo independente. Para o jornalista Luis Nassif, o editorial aponta o objetivo final do processo que explica o comportamento da mídia a partir de 2005: "a politização descabida, as tentativas sucessivas de golpes políticos, os assassinatos de reputação de políticos, juízes, jornalistas".

Redação

O jornalista Luis Nassif comenta neste domingo em seu blog o editorial publicado na Folha de São Paulo, que critica "práticas desleais na internet" que, supostamente, estariam "colocando em risco as bases que permitem o exercício do jornalismo independente no país". A Folha, no caso, se apresenta como porta-voz do "jornalismo independente". Uma piada, diz Nassif, que questiona:

"Qual o direito de conhecer a verdade que a Folha propõe? A ficha falsa de Dilma? Os arreglos com Daniel Dantas? A série sistemática e diária de matérias falsas, manipuladas, a deslealdade reiterada contra seus próprios jornalistas que não seguiram a cartilha?"

Abaixo o editorial da Folha e, depois, o comentário de Nassif:

O editorial: "Direito à informação"

Práticas desleais na internet colocam em risco as bases que permitem o exercício do jornalismo independente no país

DEMOCRACIAS tradicionais aprenderam a defender-se de duas fontes de poder que ameaçam o direito à informação.

Contra a tendência de todo governo de manipular fatos a seu favor, desenvolveram-se mecanismos de controle civil -caso dos veículos de comunicação com independência, financeira e editorial, em relação ao Estado. Contra o risco de que interesses empresariais cruzados ou monopólios bloqueiem o acesso a certas informações, criaram-se dispositivos para limitar o poder de grupos econômicos na mídia.

Essas salvaguardas tradicionais se veem desafiadas pelo avanço da internet e da convergência tecnológica nas comunicações -paradoxalmente, pois esse mesmo processo abre um campo novo ao jornalismo.

Apesar da revolução tecnológica e do advento de plataformas cooperativas, a produção de conteúdo informativo de interesse público continua, majoritariamente, a cargo de organizações empresariais especializadas. O acesso sistemático a informações exclusivas, relevantes, bem apuradas e editadas sempre implica a atuação de grandes equipes de profissionais dedicados apenas a isso. Essas equipes precisam ser remuneradas -ou o elo se rompe.

Quando um serviço de internet que visa ao lucro toma, sem pagar por isso, informações produzidas por empresas jornalísticas, as edita e as difunde a seu modo, não só fere as leis que resguardam os direitos autorais. Solapa os pilares financeiros que têm sustentado o jornalismo profissional independente.

Quando um país como o Brasil admite um oligopólio irrestrito na banda larga -a via para a qual converge a transmissão de múltiplos conteúdos, como os de TVs, revistas e jornais-, alimenta um Leviatã capaz de bloquear ou dificultar a passagem de dados e atores que não lhe sejam convenientes. A tendência a discriminar concorrentes se acentua no caso brasileiro, pois os mandarins da banda larga são, eles próprios, produtores de algum conteúdo jornalístico.

Quando autoridades se eximem de aplicar a portais de notícias o limite constitucional de 30% de participação de capital estrangeiro, abonam um grave desequilíbrio nas regras de competição. Veículos nacionais, que respeitam a lei, têm de concorrer com conglomerados estrangeiros que acessam fontes colossais e baratas de capital. Tal permissividade ameaça o espírito da norma, comum nas grandes democracias do planeta, de proteger a cultura nacional.

Contra esse triplo assédio, produtores de conteúdo jornalístico e de entretenimento no Brasil começam a protestar.

Exigem a aplicação, na internet, das leis que protegem o direito autoral. Pressionam as autoridades para que, como ocorre nos EUA, regulamentem a banda larga de modo a impedir as práticas discriminatórias e ampliar a competição. Requerem ao Ministério Público ação decisiva para que empresas produtoras de jornalismo e entretenimento na internet se ajustem à exigência, expressa no artigo 222 da Carta, de que 70% do controle do capital esteja com brasileiros.

A Folha se associa ao movimento não apenas no intuito de defender as balizas empresariais do jornalismo independente, apartidário e crítico que postula e pratica. Empunha a bandeira porque está em jogo o direito do cidadão de conhecer a verdade, de não ser ludibriado por governos ou grupos econômicos que ficaram poderosos demais.

Comentário de Nassif

Chega-se, finalmente, ao objetivo final do processo que explica o comportamento da mídia a partir de 2005, a politização descabida, as tentativas sucessivas de golpes políticos, os assassinatos de reputação de políticos, juízes, jornalistas. E para quê? Para se chegar ao embate final com pouquíssimos aliados. Esse acanalhamento do exercício do jornalismo fez com que a credibilidade da mídia atingisse o ponto mais baixo da história, viabilizasse outras alternativas no mercado de opinião.

Agora, qual a bandeira legitimadora para suas pretensões? A de que a mídia é a garantidora da liberdade de informação? Piada.

Esse mesmo álibi canhestro foi utilizado por Roberto Civita para tentar me convencer a aceitar o acordo com a Veja no final do ano passado. A revista passou todo o ano utilizando o jornalismo de esgoto para os ataques mais sórdidos, abjetos, não respeitando sequer família. E vinha o enviado especial dele trazendo o recado de que deveria aceitar o acordo em nome da liberdade de imprensa.

Conto apenas o meu caso. Como o meu, teve inúmeros. Em 2005, em entrevista ao Vermelho cunhei a expressão “o suicídio da mídia”, para descrever essa caminhada irreversível em direção ao fundo do poço. Agora, a mídia se posiciona para a grande batalha contra os portais e os grupos externos. Quem acredita nela?

Qual o direito de conhecer a verdade que a Folha propõe? A ficha falsa de Dilma? Os arreglos com Daniel Dantas? A série sistemática e diária de matérias falsas, manipuladas, a deslealdade reiterada contra seus próprios jornalistas que não seguiram a cartilha?

O futuro chegou e bandeiras que, antes, poderiam ser legítimas, ou estão rotas, puídas, desmoralizadas. Haverá uma grande batalha futura, contra os supergrupos que irão entrar no mercado. Mas dela não participará mais a velha mídia, que ficará restrito ao mundo fictício que ela próprio criou.

domingo, 8 de novembro de 2009

Blogueiros discutem os rumos da mídia (Carta Maior)

Cinco dos principais nomes da blogosfera independente brasileira estarão em Brasília, entre os dias 26 e 30 de outubro, para discutir com estudantes de comunicação e profissionais da imprensa o papel das novas mídias. Paulo Henrique Amorim, Luís Nassif, Luiz Carlos Azenha, Rodrigo Vianna e Marco Weissheimer foram convidados a falar da internet como alternativa de informação para o público, o novo mundo das redes sociais, a crise da mídia corporativa e o exercício da cidadania online. Cinco dos principais nomes da blogosfera independente brasileira estarão em Brasília, entre os dias 26 e 30 de outubro, para discutir com estudantes de comunicação e profissionais da imprensa o papel das novas mídias. À frente de blogs campeões de audiência, Paulo Henrique Amorim, Luís Nassif, Luiz Carlos Azenha, Rodrigo Vianna e Marco Weissheimer vão conversar sobre a importância das novas mídias.

Esse time vem promovendo, na internet, um amplo debate sobre a qualidade da informação oferecida pelas mídias tradicionais, servindo como paradigma na mediação entre público e notícia. Os cinco jornalistas foram convidados a falar da internet como alternativa de informação para o público, o novo mundo das redes sociais, a crise da mídia corporativa e o exercício da cidadania online.

O ciclo de palestras será gratuito e realizado no auditório principal do IESB, no Campus Edson Machado, na Asa Sul, em Brasília, das 19h às 21h30, e é uma iniciativa da própria instituição, uma das mais respeitadas da capital federal, em conjunto com a Escola Livre de Jornalismo. O objetivo é estimular estudantes de comunicação e jornalistas a debater os rumos da chamada grande imprensa e a conhecer o pensamento crítico de alguns dos principais nomes da blogosfera independente.

Segundo o jornalista Paulo Henrique Amorim, responsável pelo site Conversa Afiada, o grupo é a “Armata Brancaleone” da blogosfera brasileira, uma definição bem humorada, mas que revela o poder de influência que exercem sobre parcela significativa dos formadores de opinião no Brasil.

“Eles são uma das principais redes informais de blogs independentes, cuja missão primordial tem sido a de ser o ‘grilo falante’ da mídia tradicional corporativa, até então um poder hegemônico”, afirma o jornalista Leandro Fortes, repórter da revista CartaCapital e um dos fundadores da Escola Livre de Jornalismo, ao lado do jornalista Olímpio Cruz Neto, entidade voltada à formação de novos profissionais da imprensa. Junto com o IESB, a Escola Livre de Jornalismo é responsável pela organização do ciclo de palestras. “Unir esses jornalistas é uma oportunidade histórica para aqueles que querem falar sobre os rumos da comunicação social brasileira”, afirma Olímpio Cruz Neto.

Os cinco jornalistas convidados vêm sendo requisitados a participar de palestras e debates, Brasil afora, para falar sobre a função crítica emergente dos blogs. O papel desses novos meios tem modificado as relações entre público e mídia no país e forçado os veículos de comunicação a se adaptarem aos novos tempos. Afinal, agora, leitores atuam não apenas como consumidores de notícias, mas fiscais da imprensa, interagindo com editores e jornalistas em tempo real.

26/10 - Paulo Henrique Amorim – Jornalista com mais de 30 anos de experiência, mantém o blog Conversa Afiada, um ambiente de fluxo constante de textos entrecortados de crítica e informação. Dono de uma verve sarcástica e bem humorada, Amorim tornou-se uma referência de acompanhamento e vigilância dos erros e das manipulações da mídia, além de tratar com grande propriedade das mazelas gerais do cotidiano brasileiro. Atualmente, trabalha na Rede Record de Televisão, mas teve passagens pela Rede Globo, Rede Bandeirantes, UOL, Veja e Jornal do Brasil.


27/10 - Luiz Carlos Azenha – Veterano no uso da internet como ferramenta de comunicação desde os tempos em que era correspondente da TV Globo nos Estados Unidos, Azenha mantém está à frente de um dos blogs mais ecléticos da blogosfera brasileira, o Vi o Mundo. Trata-se de um espaço permanente de debates e idéias, com formato e dinâmica de uma revista eletrônica, permeado por artigos, reportagens e vídeos. O blog vem tratando de temas relevantes, como campanhas de prevenção a Aids e análises de conjuntura política e social. Azenha tem sido um crítico incansável do mau jornalismo praticado, em grande escala, por parte da mídia brasileira. Atualmente, é repórter da Rede Record e documentarista independente.

28/10 - Luís Nassif – Pioneiro no mundo do jornalismo eletrônico, foi um dos primeiros profissionais da imprensa brasileira a compreender a dimensão e a força da internet como meio realmente democrático de comunicação. Há dois anos, lançou-se, em seu Blog do Nassif, em uma guerra solitária ao escrever uma série de análises jornalísticas sobre a revista Veja, da Editora Abril, obra ainda em progresso. Essa iniciativa serviu para popularizar o espaço dos blogs como ambiente de discussão, crítica e fiscalização da mídia brasileira. Jornalista econômico respeitado, Nassif tem mais de 30 anos de profissão e é criador e editor-chefe da Agência Dinheiro Vivo e comentarista da TV Brasil. Antes, foi colunista e membro do conselho editorial do jornal Folha de S.Paulo, tendo iniciado a carreira na revista Veja.

29/10 - Rodrigo Vianna – O blog de Vianna, Escrevinhador, tornou-se uma voz ativa e analítica da realidade e do jornalismo brasileiro. Repórter por excelência, é dono de um texto irônico e, em muitos aspectos, divertido, cuidadosamente montado a partir de idéias e informações. Vianna faz da crítica midiática uma missão do blog. Atualmente, é repórter da Rede Record de Televisão, depois de longa experiência na TV Globo.

30/10 - Marco Weissheimer – Foi graças ao blog de Marco Weissheimer, o RS Urgente, que o cidadão do Rio Grande do Sul pode sair da escuridão midiática na qual tem sido mantido, ao longo de três décadas, por conta da hegemonia de um só grupo de comunicação social, a mandar em praticamente em todos os veículos jornalísticos do estado. Foi o blog de Weissheimer que primeiro deu visibilidade e, posteriormente, conseqüência às denúncias de corrupção que envolvem, no Rio Grande do Sul, a governadora Yeda Crusius. Por causa disso, o RS Urgente virou referência crítica e noticiosa imprescindível no Sul, sobretudo para os jornalistas gaúchos.

sexta-feira, 26 de junho de 2009

Imprensa: O fim da obrigatoriedade do diploma no jornalismo - Julio Daio Borges

Digestivo nº 421

A vida não está fácil para quem é jornalista no Brasil. Depois de décadas de redações se encolhendo e salários se achatando, a internet veio para tornar o profissional tecnicamente obsoleto e, agora, o STF veio para lavrar a obsolescência da profissão em cartório: para trabalhar como jornalista, não é mais necessário se formar em jornalismo (não é mais necessário ter diploma de jornalista) - o que ensejou a conclusão, entre muitos, de que, para trabalhar com jornalismo, não é mais preciso nem... ser jornalista. Sobrou para os blogueiros, claro.

Mas não é a mesma "guerra" da outra semana: não é a velha geração querendo manter o controle dos meios e a nova se rebelando, numa disputa entre o mainstream de antes e o de agora. A grita, neste momento, é mais pela sensação, entre universitários, de que o diploma - antes garantia de uma certa "reserva de mercado" - agora não é mais garantia de nada - porque, para trabalhar com jornalismo, aparentemente qualquer diploma de curso superior vale... O argumento está baseado na falta de experiência de quem não conhece o mercado de trabalho e que, portanto, não sabe que nenhum diploma é garantia de nada - em toda e qualquer profissão.

A obsolescência dos jornalistas e dos futuros jornalistas (agora em formação) não é a do diploma - está mais ligada à visão romântica de que ainda existem redações de jornal, como as de cinema, quando a prática se aproxima, cada vez mais, do dia a dia dos... blogs! Se um estudante montasse seu veículo on-line, no começo do curso de jornalismo, em alguns anos sairia melhor preparado, para a futura realidade da profissão, do que teóricos das antigas práticas, diagramando com tesoura e cola, discutindo a censura na ditadura militar, apegando-se a suportes, como o papel, virtualment e condenados...

O debate, do diploma, deveria alargar suas fronteiras e abordar as verdadeiras questões - o jornalismo não é mais o que era só porque o STF decretou: o jornalismo não é mais o que era porque, no tempo, parou; e não só no Brasil, no mundo todo...

>>> STF derruba a obrigatoriedade do diploma de jornalista